27 de maio de 2009

Olha!


Olha-me. Tremo silente por vida
Eu lagarta, eu borboleta, eu fêmea,
Filha escondida de acontecer, triste,
A procurar por ti, janelas escuras
Para o incompreensível a mim...
Ai de ti, ai de nós...
Vestida de trapos, vontade de terra,
Carne de meu corpo a buscar quem sou!

És tu, terno homem que me olhas sem entender,
Amante exógeno, és tu que quero ter
Em minhas cansadas ancas,
És tu que não dizes palavra que amo,
Tu que beijaste minha boca pedinte
Tu que araste minha vulva com saliva e sêmen!
Comunga comigo este ardor
Como se soubesses quem realmente sou...

A Alma tenho com outras vestes,
Véus, pulseiras, adornos,
As pálpebras desenhadas com tinta
Onde lês “Vem, vem”.
Olha-me nos olhos: sou fábula, sou lenda,
Outra face de mulher.
Olha-me, por favor, e bem dentro
Em meu solitário fundo,
Que és tu que amo,
Tu
Que me beijas sem quereres ver.

15 de maio de 2009

Mnemon



No escuro cobre do quarto
Tua boca tem gosto de volúpia faminta...
Entre as luzes difusas da janela molhada,
Teus olhos cintilam tristes
E é deles que ganho o labirinto do tempo.

Há névoa em meu olhar-mar, velhas pupilas,
Mas o barco da procura singra em meu ser gelado
Invocando tua imagem frágil na tempestade...
Teu corpo despido e entregue é avassalador,
Tal qual era assustadora a certeza em teu fremir!

E eu, velho fauno a ver-te na névoa, soçobro
Ante o inconcebível desejo de me tatuar de ti.
Busco-te no passado assim, arrebatamento devassado,
Carícia-ilha de mulher num horizonte difuso e perdido.

No escuro cobre deste quarto deserto,
Amarga está a minha boca de palavras e tinta...
Na luz parca da madrugada nua,
Meus olhos enfim apagam-se em águas-lágrimas!