Gente
No metrô
Corpos pastas mochilas guarda-chuvas
Ar viciado
Chove na cidade
Lá fora na cidade
Cento e cinquenta quilômetros de congestionamento
A faixa amarela não deve ser ultrapassada
Sem lugar para o café
Cuidado porta automática
Vida automática
Espera
E as flores - não há flores
Trem estacionado na plataforma
Destino viciado
Privacidade - sem privacidade
Mergulhado na rua agora
Reflexos de néon sobre os transeuntes
Um café, por favor – ficha no caixa
Em meia hora estou chegando
Primavera e estou chegando
Sem flores - não há flores
Anoitece
Toca o celular tocam-se celulares
Palavras & mensagens & chuva
Cento e cinqüenta passos de descomedimento
A luz amarela cintila nas gotas dágua
Seu café
Privacidade
Priva-me a cidade de mim
Ato torto Vida torta
É primavera em Sampa
Rampa do viaduto
Toca o celular
Nada de flores - não há flores
Escuto
Nos boatos da cidade
Meu silêncio noturno
Minha primavera sem dentro
sem cores – sem flores - sem mim.
22 de outubro de 2009
noturno 21 - Primavera em sAMpA
15 de outubro de 2009
Corpo de palha
Nas veias escuras da noite que me toma,
Jaz meu corpo como um velho espantalho,
Abandono, desapego, desenredo,
Dissonância.
A ave noturna voa,
Um vôo enganado pelos meus frangalhos,
Pelo meu “rosto sem rosto”,
Pelo céu.
Na fria madrugada,
Espreito imóvel.
A noite assombra o farfalhar das plantas.
Encontro-me estrangeiro sem biografia por dentro.
Sou quase nada, mãos de palha, estaca,
Distância.
Mas no bojo do mundo,
Braços abertos do espantalho,
Sou soprado no escuro corpo das horas erradias.
E então flutuo.
Esgueiro-me pela pele dos amantes,
Entre as coxas abertas e entregues,
Por rostos de mil faces,
Pelo céu de tua boca...
Nas asas da noite,
Daqui de meu canto de espantos,
Desfaço-me em insignificâncias no ar.
Eu & tu
Eu e tu somos eremita & estrada.
É teu corpo o meu percurso,
Todos os recantos de tua pele...
Tens meu desejo largo esboçado em ti.
Teus olhos negros e fundos,
São o esconderijo de meu ser cansado,
O santuário noturno e amável que me acolhe.
E entre tuas coxas de deusa,
Fenda intumescida a medrar tua volúpia,
Vou mergulhar inteiro.
Tua alma encontra a minha.
E minha lanterna ilumina meu lugar em ti.
13 de outubro de 2009
Amor Virtual
O sapo quer um beijo da princesa.
Ela, ficar na beira da lagoa.
Ele vê nela a perdida nobreza,
Ela bem sabe como nele ecoa.
O “bufo” quer estar com sua beleza,
E ela manter-se ali sentada à toa!
Ouve o batráquio com delicadeza
E ele conta que perdeu sua coroa.
E assim ficam os dois nessa indestreza
De entenderem de fato o quanto doa
A sina incônscia que nos dois destoa:
Encontrarem-se apenas na frieza
De serem somente sapo & princesa,
Caso virtual de amor de lagoa!
10 de outubro de 2009
A recepcionista
Vim medir teu corpo com os olhos,
Teus pés brincando pelo chão,
Na porta que cuidas entre as senhas da noite.
Perdido entre cortesãos e dançarinas, copos e cigarros,
O gato lascivo de Alice que aos poucos se revelou,
Observo-te nos reflexos dos vidros de tua floresta urbana.
Anfitriã gentil, andas amável pelo corredor desta esquina,
Ave de rapina, quente e bela, olhar de turmalina
Onde me abandono a procurar os olhos meus.