27 de junho de 2010

Faz


Faz frio em Sampa,
Mas em mim faz mais...
Faz saudade de outras noites,
Quentes madrugadas...

Faz tempo que daqui
Mandava devaneios nas palavras...
Abriu-se um vazio em mim
Sem as letras que lhe dava.

Faz um eco triste essa distância
A esmorecer meu sonho,
A alma na lama movediça.
De repente, na melancolia,
Remexo antigos versos inconexos.

Faz poesia, peço,
Por favor, nunca é demais...
Está bem, mas é poesia de ninguém,
Eu a por palavras no faz de conta
Por uma imagem que já me fugiu.

Faz sentido sofrer
Quando não se vê o outro lado da lua?
Quando naquela longínqua rua
Vejo-me sem estar lá?
Faz um nó dentro do peito, isso é que faz.

Faz sol e fogem os dias, chove e passa,
Mas em mim nada se move...
E meu itinerário é uma trapaça
Na história do que queria ser,
O que quase desconheço.

Ao longe, alguém sorri, sabe-se lá para quem,
Mas mesmo assim me atrevo a olhar daqui
Para esse sorriso intacto e luminoso que intuí
Sem saber de coisa alguma. De repente...
De repente, faço um poema.


Meu coração sonhador
Bomba-bombeia.
Um coração desmedido
Quase a me saltar pela boca...
Agita meu peito sofrido
Surgindo de meu oceano-alma:
- Cadê... Cadê... Cadê... Cadê...

Em sua cardeal essência,
Teimoso, a bater, persegue
As reminiscências do antigo amor,
Adormecido amor, “cadê”,
Calado amor, “cadê”,
Perdido talvez...
- Cadê... Cadê... Cadê... Cadê...

Saudades... Memória ardente,
Fogo da paixão evanescente,
Cadência forte que me envolve...
O amor em mim que se dissolve
Busco tristemente, coração,
- Cadê... Cadê... Cadê... Cadê
No vazio em mim a me doer?

A Velha Cristaleira


Estou para jogar a velha cristaleira no meio da rua.
Quero vê-la estilhaçada, cacos de louça e vidro,
Espatifada de memórias, sonhos e planos.
O lugar certo à mesa e os lugares errados herdados
Sucumbindo no asfalto com estardalhaço,
O destroçar do velho móvel, imóvel em minha alma.
Vou atirá-la da sacada dos meus olhos
bem no meio do dia, para que eu me veja
Nos pedaços inúteis guardados do tempo.
Resistir por quê se o que é novo já nasce envelhecendo?
Meu caminho incerto é lei e não tem volta.
Meus enganos não precisam de lembranças.
Na hora certa, seja lá o que isso queira dizer,
O melhor é estar de mãos vazias.