28 de março de 2008

INVENTÁRIO

(Para Denis; depois de nossas últimas conversas em festas)



Em muitos anos minhas entranhas
envelheceram mais que meus cabelos.
Tive casa, tive amores, estive quase onde queria.
A boa estrada persegui nas esquinas da noite.
Ao ir às ruas solitárias da madrugada procurei sentir,
passo a passo, que fazia eu de mim mas não me convenci.
Muitos luares eu vi.
Fixei-me em estrelas na solidão,
mas não me permiti ir além de me deslumbrar.
O sol nasceu muitas vezes em meu titubear cansado
e achei que tinha alguma resposta.
Deitei-me exausto de tantos enganos. A vida deixa seu peso.
De sombra em sombra eu voei manhã após manhã e renasci.
Mas a cada noite voltava andarilho.
Algo eu aprendi: estou só diante de tudo.
E tudo é tão incrível!
Sou um palhaço imaginador para não sucumbir.
O encanto está em todas as paixões e melancolias.
As bênçãos também!
Não me ocupo em entender, pois nada há para entender.
O amor e a alma estarão sempre no seu próprio encalço
e não se tem volta.
Mesmo quando ficava sem dormir de tanto pensar,
não conciliava o espírito.
A alma importunava querendo penar.
Não tenho medo da morte
mas a paz pertence a quem tem fé cega.
Eu não a consigo pois sempre quis ver além, ficar atento.
E o amor acontece quando estamos distraídos...
Plantei-me vento nos amigos e eles em mim.
Escrevi alguma poesia como um vício
e a soprei sobre alguns campos nus.
No mais vou vivendo com as palavras que lancei
e as tempestades que colhi.

4 comentários:

De Marchi ॐ disse...

Meu Tereso Batista, permita-me ficar triste apesar da beleza. Eu sei, e sei que a minha vai chegar. Mas é meu momento de crer no ciclo e só espero, sendo o que sou, ser tão Mario aos Denis como você o é.

Elly disse...

Puxa, Mário... Que lindo texto e que magnífico auto-retrato. Bela inspiração, poeta invejável tu és!
Encantada. Obrigada pelo convite.
Elly.

Vinícius Castelli disse...

Fui longe, muito longe agora.
Ao ler tudo isso, passou tanta coisa na cabeça. Juro !
Baccio, bello

Aden Santos disse...

Mário, seus poemas realmente são muito bons...bem construídos, instigantes e reveladores.
E nisso uma coisa me ocorre...as coisas nos sorriem mais ou a luz do sol passa a nos ser também inspiradora quando deixamos os pesos pelo caminho...
O momento do café, urge !!!